Desde março de 2016, os bombeiros da equipe Bravo do Corpo de Bombeiros Voluntários de Joinville (CBVJ) usa um equipamento nada convencional nas ocorrências, o leão Faísca. Ele foi concebido para facilitar a ação de resgate e salvamento em ocorrências com crianças.
A receptividade foi tão grande que a atuação da mascote extrapolou a corporação. Já deu plantão em unidade pediátrica de PA24H, fez companhia a crianças nos fins de semana em casa, integrou projeto de combate a incêndios no Nordeste do País e marcou presença em festa de casamento.
Tão curiosos quanto o seu papel nas ações de resgate é a história do surgimento de Faísca. Até chegar aos 15 meses de integração ao trabalho dos bombeiros, o projeto da mascote passou por um período de quatro anos desde a concepção, gestação e, finalmente, a sua criação.
O uso do boneco em resgates é um projeto do chefe da equipe, Rodrigo Luciano Jurk, bombeiro com 17 anos de carreira, inspirado em uma iniciativa semelhante de uma corporação de um país vizinho.
Em 2012, um grupo do CBVJ participou do 1⁰ Encontro Internacional de Bombeiros, na Argentina. De volta a Joinville, trouxeram na bagagem, além de experiências, fotos com as mais diversas equipes portenhas.
Uma delas mostrava um boneco do personagem Diabo da Tasmânia empregado nas ocorrências com um propósito simples: oferecer o brinquedo para acalmar crianças e, assim, ter maior facilidade para prestar o socorro.
Jurk, na época subchefe de equipe, simpatizou com o método. Foi promovido a chefe de equipe em 2015 e, no ano seguinte, pode dar o start à ideia. Começou então a “gestação” coletiva de uma mascote para a Bravo que seria usado com o mesmo propósito que o da corporação Argentina.
A personagem
A equipe toda foi envolvida e a primeira missão era encontrar um personagem. Depois de dois meses de buscas, sugestões e debates, a solução estava na própria casa do chefe da equipe: um leão de 30 centímetros de altura e farta juba dourada.
Nascia, assim, a mascote da Bravo. Faltava, então, o batismo. Novamente os “padrinhos” deram palpites e formaram uma lista tríplice, com as sugestões: Faísca, Fumaça ou Bravura. Depois de eleição democrática no grupo, foi escrito o primeiro nome na certidão.
O “enxoval” da mascote não poderia ser diferente. A mulher de Jurk, Juliéte Fernandes Jurk, tirou as medidas e costurou um uniforme de combate a incêndio na cor preta e as inconfundíveis listras em amarelo nas barras da roupa de aproximação.
A caracterização só ficou completa depois que Faísca ganhou uma medalha, com o brasão do CBVJ, e um capacete de bombeiro. De novo, entrou em cena a habilidade da família. O próprio Jurk adicionou espumas na parte interna de um capacete de brinquedo para moldar à cabeça do felino.
Com apenas 90 dias de vida, o mascote foi incorporado a Bravo e passou a fazer parte da equipe em todas as ocorrências.
Como ele ajuda
Faísca já virou uma espécie de identidade da Bravo: equipe de plantão, mascote sobre a mesa sob os olhos atentos dos demais integrantes. Segundo Jurk, antes de acionar a ajuda do boneco, os bombeiros avaliam a cena da ocorrência e, somente depois da estabilização das vítimas – e quando há crianças – recorrem à mascote.
A receptividade dos envolvidos, conta, é sempre imediata. O bombeiro conversa com a criança e propõe um acordo: “ela vai cuidar de Faísca enquanto eles, bombeiros, cuidam dela”. E há sempre uma condição: quando acabar o resgate pode fazer fotos, brincar, mas precisa devolver porque o boneco vai salvar outras crianças.
O jogo sempre dá certo. “No fim da ocorrência, a criança substitui uma situação de trauma por uma lembrança alegre”, conta Jurk. “Nunca tivemos problemas de crianças que resistiram em devolver”.
As peripécias
O sucesso Faísca foi tamanho que passou a ser requisitado para todo tipo de emergência. Tanto que nos seus 15 meses de “vida” tem extensa lista de missões e aventuras. Em uma delas, acompanhou o plantão noturno no PA 24H da zona Norte. A esposa do bombeiro voluntário Francisco José Lele, Étel Paixão, funcionária da unidade de saúde, levou o bichinho para um turno de trabalho. Muito choro de criança foi acalmado pelo boneco.
O carinho pela mascote teve todo tipo de demonstração. No casamento do bombeiro voluntário Douglas Claudino Souza com Adriana Cristina Brikau Souza, ele acompanhou os noivos, que seguiram para a igreja em uma viatura da corporação.
Como todo brinquedo, Faísca é convocada para divertir a garotada em casa. É comum os bombeiros levarem para a “noite do soninho” com os filhos. Natália Luísa, 8 anos, e Luis Otávio, 4, filhos do voluntário Alexandre Schlischting, viveram uma experiência única.
Quando Faísca foi passar uma noite na casa deles, os pequenos dedicam à mascote os mesmos cuidados e regalias que têm dos pais: ganhou brinquedos, gibi para ler no banheiro e carrinho de bebê para dormir entre fofos cobertores.
E virou celebridade! Os fãs mais recentes são os Irmãos Feitosa, os quadrinhistas responsáveis por ilustrar o gibi “Liga dos Bombeiros Voluntários de Joinville”. No colo de Eduardo Feitosa, Faísca participou de um painel na 14ª Feira do Livro de Joinville.
As viagens
O bombeiro Alexandre Schlischting é um entusiasta do uso do boneco em ocorrências. Como piloto de aeronaves, levou Faísca para participar do Programa Bahia sem Fogo, em fevereiro deste ano. No rumo para o Nordeste do País, viajou de avião, com direito a fotos com comissária de bordo e poltrona junto à janela!
Já durante a missão, a bordo do helicóptero e no assento do copiloto, o mascote da Bravo sobrevoou por dias o Parque Nacional da Chapada Diamantina. Em várias ocasiões, o olhar desolado de crianças foi substituído por um sorriso quando foi apresentado ao pequeno leão.
Além de acumular milhas aéreas, Faísca difundiu a experiência dos bombeiros voluntários de Joinville, encantou as demais corporações que participam da ação e foi presenteado com um chapéu típico do cangaço.
Um sósia
As histórias de famílias se acumulam na biografia da mascote. No início deste ano, uma sobrinha do chefe Jurk viajou para os Estados Unidos com um grupo de escoteiros. Em Pontiac, no Estado de Michigan, foram conhecer o quartel dos bombeiros. De lá trouxe souvenires para o tio e deixou a promessa de enviar lembranças da corporação joinvilense.
Faísca, então, se prepara para cruzar as Américas. Bem, não exatamente o Faísca da Bravo. Jurk está providenciando um sósia. A intenção é despachar um boneco ainda este mês. Na bagagem, o “caçula” da equipe vai levar a coragem, a tradição e um pouco das histórias dos Bombeiros Voluntários de Joinville.